quarta-feira, 19 de junho de 2013

Impressões sobre a Manifestação em Hamburgo


Ontem, 18 de junho de 2013, foi realizada uma manifestação na cidade de Hamburgo, Alemanha, em apoio aos protestos que estão ocorrendo no Brasil. A manifestação foi pacífica, e reuniu mais de 250 pessoas. Apenas quatro policiais acompanhava a multidão que caminhava cantando as mesmas coisas de sempre "O povo, unido, jamais será vencido", e outros conhecidos gritos-de-guerra de manifestações.

Esta imagem resume muito bem o protesto: pessoas de diversas idades, etnias e credos caminhando juntos em prol de um país melhor. Também é possível ver nesta imagem uma pessoa sentada em uma cadeira de rodas, participando normalmente da manifestação. No Brasil, uma pessoa em uma cadeira de rodas provavelmente não participaria das manifestações, já que não daria tempo de fugir do gás lacrimogêneo. O ambiente agradável deste protesto, fez dele uma mani-festa-ação, com diversão, reflexões e discussões, dando maior visibilidade à causa, e criando um ambiente adequado para discutir os problemas, e definir novas metas.



A primeira observação interessante: mal começou a concentração de pessoas em frente à Estação Central de Hamburgo, já tinha algumas pessoas puxando o coro do Hino Nacional. Foi uma belíssima cena ouvir diversas vozes cantando em uníssono nosso hino. No entanto, no momento em que deveriam cantar "Deitado eternamente em berço...", começou a confusão e a canção parou. Eu particularmente não acho o Hino Nacional adequado para manifestações democráticas, já que ele é o símbolo da subversão da democracia em prol do elitismo, uma vez que quando foi criado ele perdeu o concurso, mas devido à influência de alguns, acabou se tornando o Hino Nacional Brasileiro.

Apesar do protesto ter sido excelente em alguns aspectos, em outros aspectos deixou a desejar. As pessoas que mais falavam ao megafone, que de fato transmitiam a imagem do movimento, elas levantavam questões irrelevantes e/ou risíveis. Estas pessoas fugiam ao tema e em alguns momentos iniciaram um grito "13 unter" ("abaixo o 13", referindo-se ao PT). Lamentável terem perdido tempo com isto. Outro sujeito tentou defender o que ele chama de "impeachment" da Dilma. Ele nem ao menos conhece o conceito da palavra impeachment, e não soube explicar as razões para "impeachmá-la".

Um dos mais belos momentos da passeata foi quando cantamos "Pra não dizer que eu não falei das flores", de Geraldo Vandré (ver vídeo1). Acho que esta música é mais adequada para uma revolução, e não para a situação atual, mas ainda assim causa arrepios.

No geral a manifestação foi tranquila e muito boa, apesar dos deslizes individuais. Conseguimos chamar a atenção do povo alemão para os problemas do Brasil. A imprensa cobriu o evento e entrevistou muitas pessoas (é disto que eu tenho medo). Resta agora pensar nos próximos passos do movimento. Já é hora de fazer a pauta tem de convergir para algo concreto!

As fotos da manifestação estão disponíveis em: link
Também gravei alguns vídeos: vídeo1 vídeo2 vídeo3

***
Encerro aqui com um belíssimo poema escrito pelo meu amigo Nícollas Ranieri que foi publicado numa antologia de poemas inspirados pelos acontecimentos recentes.


#PARTIU, VINAGRE

O ar, irrespirável,
é o que todos sabem.
E por isso vamos para a rua.
Pede-se passagem.
Porque irrespiráveis são os ônibus,
os metrôs, e as salas com
ar-condicionado
onde desempenhamos
o vulgo papel civilizado.
E sabemos que estamos
condicionados.
Admirável mundo novo, o
niilismo, o cinismo,
também se esgota.
E todo o nosso esgoto
está batendo à porta.
Mas onde já se viu? Chamamos
de desobediência civil.
Já decidiram: querem nos sufocar.
Bombas de gás lacrimogêneo,
balas de borracha.
Para demarcar terreno,
impedir o centro,
impor a margem.
Mas pede-se passagem.
Não estamos mais sentados,
e ainda pensam que é por centavos.
É uma questão de tempero,
de sabor, de salada.
Para alguns não é nada,
e talvez não seja bem um milagre,
mas ainda temos o vinagre.

Nícollas Ranieri

segunda-feira, 17 de junho de 2013

Obrigado, Brasil!

Terça-feira, 18 de junho de 2013. 03:00 da manhã, eu ainda acordado acompanhando ao vivo os protestos no Brasil. Estou tentando dormir há 3 horas, mas não consigo. Estou em êxtase acompanhando o que eu pensei que nunca fosse presenciar na minha vida: o levante do povo brasileiro contra as atrocidades disfarçadas de politicagem cometidas pelo nosso governo. Lamento profundamente por estar do outro lado do Atlântico, por não poder participar do que pode ser a maior manifestação popular no Brasil desde os Caras Pintadas. 
Quase 200 mil pessoas foram às ruas em diversas partes do país, de Norte a Sul, de Leste a Oeste. A imagem abaixo mostra as ruas do Rio de Janeiro repleta de manifestantes.


Em Brasília manifestantes ocupam a área externa Congresso. Esta certamente é uma das imagens mais simbólicas que já vi na história do país. Só espero que estes manifestantes não tentem invadir e tomar o Congresso. O recado já está sendo dado. Evitemos confrontos desnecessários. A situação do Brasil não requer violência, requer diálogo.


Numa belíssima cena, de mãos dadas, os manifestantes que ocuparam a área externa do Congresso demonstram que o Brasil pode estar num momento crucial de sua história, em que o povo está tomando o poder em suas mãos, e lutando pela transformação do país.

Infelizmente, a manifestação não foi pacífica em todos os lugares. No Rio de Janeiro e Porto Alegre um pequeno grupo de delinquentes vandalizou locais públicos, ateou fogo a veículos e exigiu resposta da polícia. No entanto, as manifestações de hoje, principalmente a de São Paulo, foram marcadas por uma demonstração do poder popular, e pela calma e pacifismo durante os protestos. A todos os participantes que agiram pacificamente, parabéns pelo comportamento. No entanto, para futuros protestos, peço aos manifestantes que virem atos de vandalismo que se lembrem: um delinquente pode manchar a imagem de todo o movimento. Se a maioria se organizar, é possível controlar estes vândalos.

Me despeço de vocês agora, quase 03:30 da manhã, orgulhoso de dizer que sou brasileiro, país cujo povo foi capaz de vencer o conformismo e levantar-se contra as injustiças sociais, lutando por um país melhor. Não pude participar ativamente das manifestações, mas agradeço a todos aqueles que o fizeram por mim. Obrigado, BRASIL!


sábado, 15 de junho de 2013

Winter is [NOT] coming - A dream of spring



The Starks used to say: "Winter is coming". If you have ever watched and/or read the series of books from George Martin, you know what it means. However, winter is not coming in Brazil. It is not even ending. So, how can spring be coming? We can say that the "spring equinox" in the arabic world was December 18th, 2010. The Arab Spring was marked by protests, conflicts, and civil wars. The main causes are the dictatorial regimes, the violation of human rights, corruption, economic problems, unemployment, etc. Certainly the two main goals of the Arab Spring were to bring down the dictatorships and preserve human rights, and these goals demanded popular mobilization and an armed conflict, since obviously whoever was in power would not give it up without a fight.

"It is not only 20 cents", say the mobs about the real cause for these protests. In the beginning it was only 20 cents, the real cause for the mobilization. It is nice to say that the 20 cents were not the cause, but they were. Nevertheless after the violent [re?]action from the police the movement changed. New goals arose, and what once was a protest against the increase of the bus price by 20 cents became the dissatisfaction of the people with their (mostly) corrupt government, the low quality of the health, educational and transportation systems, and public safety problems.

These may have been the most expensive 20 cents of the brazilian history. It may have tiggered what many have been referring to as "Brazilian Spring". This may be the beginning of a popular revolution, and a landmark upon which new conquests will be built. Yet this is not spring. Spring is not coming in Brazil. Many people would like to fight for a better world. I sincerely admire their idealism, and pray that they go on, but we do not have a government killing millions. We do not have a government censoring the internet. We do not have a dictatorship restricting out individual freedom.  [We have Marco Feliciano tough] We do have public safety problems, corruption scandals, low quality health and educational systems. It is worth fighting for all this, but let's not compare our fight with the arabic one. Let's not bring their revolution down to the level of our protests by making this kind of comparison. We are not in winter as they once were, and therefore we can not expect spring to come.

Winter is [NOT] coming - Um sonho de primavera

* English version: 
http://tabacariadozaratustra.blogspot.com/2013/06/winter-is-not-coming-dream-of-spring.html


Já diziam os Starks: "Winter is coming". Quem já assistiu a Game of Thrones e/ou leu a série de livros de George Martin, sabe o significado disto. Mas o inverno não está chegando no Brasil. E também não está terminando. Então, como pode a primavera estar chegando no? Pode-se dizer que o "equinócio de primavera" no mundo árabe se deu em 18 de dezembro de 2010, o início da "revolução". A Primavera Árabe foi marcada por diversos protestos, conflitos e guerras civis. As principais causas foram os regimes absolutistas, violações de direitos humanos, corrupção, problemas econômicos, desemprego, etc. Sem dúvida, o combate aos regimes absolutistas e as violações de direitos humanos foram as duas bandeiras marcantes, e que de fato demandavam mobilização da população para um combate armado, pois obviamente ninguém iria deixar o poder sem luta.

"Não são apenas vinte centavos", é o que dizem os manifestantes sobre a causa dos protestos. No início foram apenas os 20 centavos. É bonito dizer que a causa de tudo não foi apenas 20 centavos, mas foi. No entanto, após a violenta [re?]ação da Polícia Militar, o movimento se transformou. Novas bandeiras surgiram, e o que antes fora apenas 20 centavos se transformou na insatisfação de um povo com relação ao seu governo (em geral) corrupto, aos problemas sociais, à baixa qualidade da educação, saúde e transportes, aos problemas de segurança. 

Estes podem ter sido os 20 centavos mais caros da História do Brasil. Podem ter sido a gota d'água para o que muitos têm chamado de "Primavera Brasileira". Pode ser o início de uma revolução popular, e pode ser um marco para novas conquistas. Mas isto não é primavera. A primavera não está chegando ao Brasil.  Muitos saudosistas gostariam de lutar por um mundo melhor. Admiro o idealismo, e rogo que continuem, mas não temos um governo matando milhões de pessoas. Não temos um governo censurando a internet. Não temos um governo ditatorial nos privando de todas as liberdades individuais (a salvo em alguns casos particulares). [Mas infelizmente temos Marco o Feliciano ] Temos sim problemas de segurança, escândalos de corrupção, saúde e educação de péssima qualidades. Vale a pena lutar por isto, mas não comparemos nossa luta com a primavera dos árabes. Não mediocrizemos a luta deles comparando-a à nossa. Não estamos passando por um inverno como eles passaram, e portanto não podemos esperar que a primavera venha. 


sexta-feira, 14 de junho de 2013

Guy Fawkes e a "baderna" em São Paulo

Os recentes eventos em São Paulo têm ocupado grande parte da minha News Feed do Facebook. Vi que estes eventos tiveram uma repercussão internacional, e diversas pessoas de outras partes do mundo têm compartilhado links com textos de jornais de seus países tratando sobre este tema. Naturalmente, não posso ficar alheio a isto, e venho aqui fazer o que todos fazem (ou adoram fazer): apontar o dedo para os culpados.

Eu fico indignado ao ler o que os revolucionariozinhos filhinhos de papai postam de seus iPhones: como a polícia é má, e como os manifestantes foram injustamente tratados. Sim, parte da polícia é má, e parte dos manifestantes (e dos coitados que estavam no lugar errado na hora errada) foram injustamente tratados. Mas parte dos manifestantes são baderneiros, vândalos, e acho que merecem borrachada.

Também fico indignado ao ver na TV as máscaras do filme V de Vingança ocultando a face de alguns criminosos, enquanto os verdadeiros manifestantes estão mostrando abertamente seus rostos. Lembro-me de como esta máscara outrora simbolizara a transformação, o fim de um regime opressor e a transição para um regime democrático, a liberdade de expressão, a união das pessoas sob uma única bandeira e identidade. Espero que esta máscara seja lembrada juntamente com as reais manifestações em prol da liberdade, e não como o símbolo dos baderneiros que fizeram parte deste belo movimento.

Primeiramente, o que desencadeou esta onda de manifestações? O aumento das tarifas de ônibus de R$ 3,00 para R$ 3,20. Parece pouco, mas este aumento tem profundas implicações para as classes econômicas menos favorecidas. Recomendo este texto que mostra que este aumento implicaria que pessoas de baixa renda seriam obrigadas a pular refeições. Não vou nem comentar sobre a qualidade do transporte público em São Paulo, que todos sabemos que é péssima.

Há tempos eu não via uma manifestação popular no Brasil que tenha tomado tal dimensão. Fico realmente feliz por isto. As redes sociais (e portanto a internet) cumpriram seu papel de mobilizar multidões e leva-las às ruas. Dentre os manifestantes, diversos utilizam máscaras de Guy Fawkes, imortalizado através do personagem V de Vingança, o herói anarquista que inicia a revolução contra um governo fascista. Começa aqui a analogia que só existe na mente de alguns: o governo brasileiro pode ter muitos defeitos, mas certamente não é fascista. E se a proposta da manifestação é ser pacífica, por que esconder o rosto atrás de máscaras? Apesar de ser um grande fã de V de Vingança e um admirador do valor simbólico da máscara de Guy Fawkes, seu uso neste contexto é desnecessário. Ela foi erroneamente utilizada por baderneiros que queriam cometer atos de vandalismo, ocultar suas faces, e se mesclar à multidão. Estes baderneiros não só sujam a imagem do movimento mas também denigrem o valor simbólico da máscara, utilizada em belos movimentos populares durante a Primavera Árabe. Esta mesma máscara é utilizada pelo grupo hacktivista Anonymous em vídeos de suas operações.

Obviamente a proposta do protesto era ser pacífico, e utilizar o poder da mobilização popular para atingir o objetivo de reduzir o preço da tarifa de ônibus. Um grupo de baderneiros se juntou ao movimento para cometer atos de vandalismo, e manchou o nome de todo o movimento. Por isto, peço a todos aqueles que realmente desejam fazer manifestações pacíficas, que denunciem estas pessoas, ou se preferirem agressão, que seja contra estes inimigos internos.

Voltemos nossa atenção agora às ações da Polícia. A Polícia, assim como o movimento, é formada por policiais "bons" e "maus". Muitos deles com seu medíocre salário precisam utilizar ônibus e outras formas de transporte público diariamente, e seguramente estão torcendo pela redução da tarifa. No entanto, é o trabalho deles garantir a ordem, e evitar que o patrimônio público seja depredado por um pequeno grupo de vândalos, o câncer deste movimento.  Por outro lado também sei que existem policiais maus, sádicos, que se juntaram à força policial apenas para oprimir e gozar do poder que o ofício lhes confere, poder este que permite a consumação de atos de violência descabida, sem acarretar a devida condenação.

Portanto, existem dois (talvez) lados deste movimento, e também da polícia. Existem manifestantes bons e maus, assim como existem policiais bons e maus. Cabe aos próprios manifestantes eliminarem o câncer do seu movimento (os vândalos), ao governo e à própria força policial identificar e punir os policiais opressores, e a todos  suportar a maior manifestação popular no Brasil dos últimos tempos.